sexta-feira, agosto 18, 2006

H2o (2ª parte)

Limpo a testa.
Continuo sentada. O mundo corre, mas eu não tenho para onde. Apenas o nada, o desespero, a solidão, apenas interrompida por estas pequenas coisas lindas. Estas criações divinas que transmitem paz e por vezes me salpicam a cara com o bater das suas asas.
Aqui estou. O que fiz, ou antes o que não terei feito para que ninguém repare que exista. Um dia também eu fui algo, representei algo, senti-me parte de algo e de alguém. Mas agora, sinto-me só. Primeiro perdi o emprego, depois foi o meu marido a ir-se embora e por fim, um a um todos os meus amigos foram-se afastando, ou pior morrendo.
Quem sou? Só sei apenas o que sou, apenas mais uma Zé-ninguém aqui sentada neste parque afastado do mundo que durante todo o dia, todos os dias alimenta estes pequenos pássaros. Será que eles sabem quem são? O que são? O que representam? Ao menos não se sentem sós, cantam, brincam…
Tenho sede.
Levantou-se afastando-se do bando de pássaros que ruidosamente a rodeavam e dirigiu-se para o bebedouro. Lá sentiu o toque frio da água.
Após saciar a sede pousou o copo na mesa. Estava escuro. Nenhum ruído era perceptível. Tinha acordado como todas as outras noites com sede após aquele sonho que a perseguia. Também se sentia só, principalmente agora que estava fora da sua cidade, afastada dos seus amigos e família. Tudo por causa do seu grande sonho de criança. Sonho que tinha sido alimentado pela sua família de tal forma que agora desconhecia se realmente é mesmo seu. Como sempre Francisca tinha seguido as indicações daqueles que a rodeavam, mas ao contrário de sempre não se sentia bem, sentia-se apenas só, desapoiada, sem ninguém, e pior que tudo isso, perturbada por uma ideia constante que este não era de facto o caminho melhor para si. Precisava de mudar. Mas para onde? De que forma? Para quê?
Era um constante medo de errar, o constante medo de desapontar aqueles de quem gostava. Era o constante medo de se encontrar verdadeiramente…